Desta vez o leitor participa. A última frase do conto está em branco, para quem quiser sugerir. Na primeira consulta que fiz por e-mail, vieram respostas das mais politicamente corretas às mais irônicas. Qual seria a sua frase? O que você diria?
- Eu quero um pato.
Júlia foi enfática, como toda criança birrenta. E não teve Cristo que a fizesse mudar de idéia.
Maldita visita da escolinha ao sítio, pensei.
Geremias logo estava entre nós. Com suas penas delicadas, seu grasnar suave e seu rebolar engraçado, que Júlia imitava o tempo todo. O novo animal de estimação era pura atitude e personalidade. Cagava e andava. Literalmente.
O bicho foi crescendo cada vez mais. E cagando cada vez mais também. E como cagava. Quack, quack, ploft. Quack, quack, ploft. Soltava suas penas enormes, seu grasnado estridente e suas fezes por toda a casa.
Apelei. Disse que ele estava triste, o pobre. Prometi que ele não viraria assado, mas que ele precisava estar entre os de sua espécie. Achei dois livros de histórias infantis que jogaram a meu favor. Júlia acabou aceitando que seus bichos de pelúcia não eram a melhor companhia e, seu quarto, o melhor ambiente para o desenvolvimento da ave.
Marcamos a despedida. Seria no lago do parque, onde viviam muitos outros patos como Gê, mas que não defecavam no meu carpete e nem saltavam do armário quando eu abria a porta.
No dia, Júlia conversou meia hora com Geremias. Entendiam-se bem, os dois. Prometeu vir visitá-lo e tudo mais.
Cumprido o ritual, Júlia colocou o bípede na água, devolvendo-o ao seu habitat natural.
Mal começou a nadar quando os demais patos se aproximaram amistosamente, como se recebendo o novo membro do bando.
Júlia abriu um sorriso e eu suspirei, aliviada.
- Viu só, minha filha...
Antes que eu pudesse concluir a frase, os animais o cercaram e o ataque ao intruso começou. Bicaram Geremias, que agonizou, até a morte.
- ... SUA FRASE AQUI
O Destro
18 comentários:
Apavorado com a situação que ali se encontrava, não entendendo o que se passava no reino animal atualmente, olhei para minha filha com um ar atônito e disse:
Júlia olha para sua mãe, que estava apavorada, e diz:
- Viu mãe, isso que dá fazer tanta merda.
Primeiro, Julia solta um estridente grito de pavor devido a tamanha agressividade dos anfitrioes. Coloquei minha mao sobre seu ombro e senti-a paralisar. Passou a observar gelidamente a cena. E num suspiro que so consegui interpretar como sendo de alivio. Um alivio morbido, pensei. Senti seu ombrinho empurrar todo o ar dos pulmoes: - Mae, o tio Antenor ainda empalha bichinhos?
E com a expressão inalterada olhei para júlia e disse:
- Viu só, minha filha. Destes ao pobre pato a chance de morrer entre os seus.
...os patinhos estão brincando de....de....hã....bem...como é aquela música mesmo, Júlia? Ajuda a mamãe, vamô lá: "Dois patinhos foram passeaaaaaar, além da montanha para brincaaaaaaaaaaaaar....a mamãe gritou quá quá quáááááá....e....só...só....voltou...voltaram e....hã... - terminei a frase com um sorriso amarelo-peido e a nítida sensação de que a palavra MERDA combinava, e muito, com ele. Júlia, de olhos arregalados, ficou imóvel por longos 57 minutos. Até hoje, ela não se aproxima de patos.
E não ouve músicas da Xuxa.
O Canhoto
ANTES DE MAIS NADA...
(AI Q SACO, JA TEM UM FINAL IGUAL AO MEU...)
Diante de cena tao brutal... nada me ocorreu, a nao ser cantarolar junto com Júlia ".... cinco patinhos foram passear...."
(quando estava lendo a história confesso q a música irritante - diga-se de passagem, da xuxa não me saiu da cabeça....)
então:
seis patinhos foram passear além das montanhas para brincar...
Atordoada com a cena, respirei fundo e coloquei a mao sobre o ombro de Julia concluindo aquela jornada mortal, dando as costas para o lago onde ainda se escutavam os derradeiros suspiros de Geremias.
Saimos caminhando rumo a um por-do-sol maravilhoso, porém Julia inquieta e nao satisfeita, queria saber o que tinha acabado de acontecer ali. Tomada de um sentimento materno, agaichei-me frente a Julia e disse.
- fique tranquila, os patos costumam receber novos membros dessa maneira, é como um ritual de aceitaçao.
Julia aprovou a explicaçao, dizendo que daquela forma era melhor, assim nao ficaria tao preocupada em cagar os pés quando chegasse em casa.
- Ví pai... tô vendo! Se fosse pra matar o bichinho , devíamos ter feito em casa... pelo menos podíamos fazer um assado!
E o pai, foi pra casa pensando onde foi parar a ingenuidade infantil!
_ O mundo é um lugar perigoso, cruel e doente. Por isso que tu só pode começar a pensar em sair de casa depois dos 32, formada e casada com um bom partido.
Julia disse:
- Que ideia de merda, pai!
Minha filha quando você crescer vai aprender o que quer dizer "CADEIA" alimentar e liberdade "INcondicional"!
Nisso entrou um ladrão na beira do lago para levar o Geremias embora, afinal estava morto e poderia comê-lo. Fui até o rapaz e disse:
- Ô bucéfalo! Não o interpelo pelo valor intrínseco do bípede palmípede, mas sim pelo ato vil e sorrateiro de profanares o recôndito de sua penosa alma. Se o faz por necessidade, transijo, mas se é para zombares da honrosa dignidade da minha primogênita, dar-te-ei com minha bengala fosfórica bem no alto da tua sinagoga que te reduzirei a nonagésima quarta potência do que o vulgo denomina nada!
O ladrão com o pato embaixo do braço olhou pra mim e disse:
- Tá doutor, eu levo ou deixo o pato?!?
ih!!!!!!! e agora!!!!!!!!!!
...como nem os colegas de espécie parecem gostar do Gê.
Afundei até o joelho no lago e voltei com Geremias no colo. A cabeça dele pendia inerte, balançando enquanto eu caminhava. Na margem, peguei seu o pescoço e o estiquei com as duas mãos à minha frente enquanto dizia à Julia:
-presta atenção.
Cravei os dentes no pescoço de Geremias com força, um fio de sangue começou a verter. Ofereci à ela:
-bebe, filha. Tem mais ferro que um danoninho.
- Vi. Me dá outro???
- Mãe, quero um coelho.
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